segunda-feira, 24 de agosto de 2015

PAOLA CAROSELLA: GUAPA COM CONTEÚDO. (09/08/2015)

Sucesso na cozinha e como jurada de reality show, Paola Carosella é como suas receitas: autêntica, sem firulas e com personalidade de sobra.

Guapa com conteúdo (Foto: Rogério Voltan)
Guapa com conteúdo (Foto: Rogério Voltan)Paola, sem frescuras: "Alimentação é o que me interessa"

Plantar e colher. Era essa a brincadeira predileta de Paola Carosella aos 4, 5 anos. Filha única de pais separados, passava grande parte do tempo na casa dos avós, em Buenos Aires, na Argentina. “Cresci cercada por jardins, bichos, fogo”, diz a chef do Arturito e doLa Guapa Empanadas, em São Paulo, e jurada do reality show de culinária MasterChef Brasil, exibido pela Band. A infância, lembra ela, hoje com 42 anos, tinha cheiro de lenha, de peixe na brasa. E do colo dos ascendentes italianos.
Sua mãe era o sustento da casa. Com 20 anos, teve a menina com o marido doente que, dois verões depois, rompeu o casamento e não tinha como ajudar com as despesas. “Minha mãe se formou em Direito e cresceu profissionalmente sendo a minha mãe”, diz a chef. “Ao mesmo tempo em que queria fazer as coisas dela, queria cuidar de mim.” Nas férias, nos fins de semana e feriados, Paola ficava com os avós e a mãe estudava. “Era guerreira, trabalhadora, forte.” E não tinha tempo para “mimimi”.

Guapa com conteúdo (Foto: Rogério Voltan)
Guapa com conteúdo (Foto: Rogério Voltan)Com massa bem tostadinha, as empanadas da Paola fazem a alegria dos clientes do La Guapa (Foto: Rogério Voltan/Editora Globo)


A filial do La Guapa, dentro da Livraria da Vila, nos Jardins: delícias argentinas  servidas em São Paulo, cidade que a chef adotou há 14 anos (Foto: Rogério Voltan/Editora Globo)A filial do La Guapa, dentro da Livraria da Vila, nos Jardins:
delícias argentinas servidas em São Paulo, cidade que a
chef adotou há 14 anos (Foto: Rogério Voltan/Editora Globo)
Tal qual Paola. “Ela é rigorosa, profissional, séria”, diz o colega de reality Erick Jacquin. “Não imagino o MasterChef sem ela”, emenda o francês. “Temos uma cumplicidade muito grande”, diz Henrique Fogaça, do paulistano Sal Gastronomia, que completa o time de avaliadores. Para ambos, o fato de Paola ser a única mulher no time não faz diferença: o que conta ali não é o sexo, mas a personalidade e a experiência – coisas que Paola tem de sobra.
Nem sempre foi assim. Quando decidiu trabalhar com gastronomia, a chef se deparou com uma dificuldade que poderia ter sido decisiva. “Naquela época [início dos anos 90], não existiam mulheres na cozinha”, diz. Paola chegou a cursar a faculdade de Administração – por dois dias. Mudou de rumo ao encontrar um restaurante de fondues e raclete onde poderia aprender a profissão que realmente queria ter. Com uma condição, porém: “Pagava 100 dólares por mês para trabalhar”, conta. O estágio serviu como entrada no masculino mundo da cozinha profissional. Logo arranjou emprego numa casa de comida crioula, também na capital argentina.

Peças de ágata compõem o charme do La Guapa (Foto: Rogério Voltan/Editora Globo)
Peças de ágata compõem o charme do La Guapa (Foto: Rogério Voltan/Editora Globo)Peças de ágata compõem o charme do La Guapa (Foto: Rogério Voltan/Editora Globo)


Com alguma experiência, era hora de ir mais longe. Mas a viagem a Paris, capital mundial da gastronomia, durou só quatro meses. “Há uma diferença entre ser exigente e perverso. Lá, eles eram perversos.” De volta ao país natal, trabalhou em todos os lugares possíveis. Tinha praticamente zerado a lista de restaurantes locais, só faltavam os de Francis Mallmann. “Achava que ele era muito metido, não tinha vontade de dividir uma cozinha com ele”, conta. Acontece que sua mãe era advogada do homem e tratou de mudar a imagem ruim que a filha tinha do principal chef argentino. Com Mallmann, Paola aprendeu a controlar o fogo, desenvolveu o respeito absoluto pelos ingredientes e carimbou no passaporte sua entrada no Brasil.
“Eu estava me estabelecendo em Nova York com o meu então namorado e Mallmann foi me visitar”, conta. “Estávamos juntos quando o Belarmino [Iglesias Filho, da cadeia Rubaiyat] ligou para ele pedindo alguém para tocar o Figueira.” A empatia com o empresário foi imediata. “Poucas pessoas têm a capacidade de trabalho dela”, diz Iglesias. Sem nenhuma experiência em liderar equipes, a chef vestiu o avental e encarou o restaurante que recebia cerca de mil pessoas por dia. E não foi só isso. “Paola me ensinou a trabalhar no forno a lenha de uma maneira que eu nunca tinha visto. Cria sabores quase sem usar temperos, é impressionante.”

Editora Globo (Foto: Editora Globo)
Editora Globo (Foto: Editora Globo)Batida de café, feita com leite de castanhas e tâmaras
(Foto: Rogério Voltan/Editora Globo)


Foi com essa simplicidade que abriu o Julia Cocina dois anos depois, usando o dinheiro que restava da herança de sua mãe (os pais de Paola morreram na mesma época, quando ela tinha 27 anos), e se estabeleceu de vez em São Paulo. “Era um período de transição na gastronomia”, lembra.  A sociedade mal costurada a afastou do negócio e Paola decidiu tirar um ano sabático. “Passei oito meses chorando”, diverte-se. “Meu telefone ficava uma semana sem tocar, vivi momentos de profunda solidão.” Os quatro meses restantes ela passou com um namorado novo num giro pela América Latina. Na volta, nasceu o Arturito.
“Como tinha dois andares, ficava no de cima cozinhando e pouco me importava com o que acontecia embaixo.” Mas o restaurante tinha muito mais a cara dos seus sócios do que o dela. “Era escuro, imponente, cheio de frescura”, diz. Paola queria menos. “Meu desejo maior é preparar uma boa carne, boas batatas, uma salada gostosa”, diz. “Não tenho um pensamento profundo, uma elaboração ou uma vontade de ser diferente por trás do que eu faço.” Em 2012, decidiu enxugar o cardápio, repaginou o ambiente e a casa ganhou novo vigor.

Tabletón: camadas fininhas com doce de leite (Foto: Rogério Voltan/Editora Globo)
Tabletón: camadas fininhas com doce de leite (Foto: Rogério Voltan/Editora Globo)Tabletón: camadas fininhas com doce de leite


A filosofia de comida boa, sem firulas, foi também o que norteou seu outro empreendimento, La Guapa Empanadas. O café, inaugurado no ano passado no Itaim Bibi e já com uma filial dentro de uma livraria nos Jardins, serve o pastel à moda argentina, tostadinho e com recheio generoso.
Não por acaso, lhe chamam mais a atenção os cozinheiros de casa do que os de grandes restaurantes. “Alimentação é o que me interessa”, afirma. É esse o motivo que a faz ouvir cada fã que a aborda (apesar de andar nas ruas com o cabelo no rosto, porque morre de vergonha de ser reconhecida). Seu prazer é escutar que o garoto começou a frequentar a feira, a recém-casada perdeu o medo do fogão, a universitária abriu mão dos enlatados. “Isso é o importante, o resto todo é bobagem”, diz.
A carreira de apresentadora nunca esteve em sua mira – recusou inúmeras vezes o convite para fazer parte do time de jurados do reality, até ser convencida pela produção. Mas, certamente, estava na sua história. Se seu passatempo na infância era brincar de camponesa, na adolescência suas tardes eram preenchidas com o programa de culinária Buenos dias, Mucho gusto. “Eu corria para a geladeira e preparava alguma coisa diante de espectadores imaginários”, lembra. Atualmente, mostra total desenvoltura diante das câmeras. “Ela é a mais natural dos três”, diz a estudante Jéssica Ferrara, fã do MasterChef desde o primeiro episódio. “Além de delicada, é paciente e foca sempre na comida, no momento da avaliação. Diferente dos outros que, muitas vezes, são grosseiros de graça.”

Editora Globo (Foto: Editora Globo) 
Editora Globo (Foto: Editora Globo)O recheio das empanadas: carne, ovos e batata
(Foto: Rogério Voltan/Editora Globo) 

Ainda assim, o personagem que mais lhe agrada é o de mãe de Francesca, a garotinha de cabelos louros e olhos azuis de quase 4 anos que teve com um arquiteto argentino, do qual já se separou. “Tenho uma sorte que minha mãe não teve”, afirma. “Estou numa fase que não tenho mais que provar tanta coisa. Já percorri boa parte do meu caminho.”
Hoje, deixou para trás a fama de antipática e recebe todos com atenção. “Sou muito reservada, e antes não tinha muito o que contar”, resume. O resto de seu tempo passa com sua filha, suas batatas e o namorado fotógrafo, que mora em Londres e vê uma vez por mês.  “Não é o máximo?”, pergunta. “O que mais posso querer da vida?”.



Fonte. http://revistacasaejardim.globo.com/Casa-e-Comida/Reportagens/Comida/noticia/2015/08/guapa-com-conteudo.html

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